
E você não me conhece, eu não conheço você.
Te escrevo por absoluta necessidade. Não conseguiria dormir outra vez se não te escrevesse. [...]
A dor que incomoda, a dor que consome.
Posso sentir o suco gástrico corroendo lentamente a minha parede estomacal. Posso sentir o cheiro de esgoto, posso ver a cor amarela, o líquido escorrendo.
Eu comi uma parte do meu dedo, e agora ele queima. Foi bom. Numa atitude antropofágica eu me consumo a fim de que outros não me consumam, eu tomo parte de mim, a fim de que ela permaneça aqui.
Sinto falta de algo não nomeável, e acho que já escrevi tudo quanto podia, quanto devia.
Eu te vejo tarde da noite no ponto de ônibus, esperando seu ônibus? Esperando seu amor? Esperando seus pais, amigos, namorada? Eu te vejo.
E a janela reflete minha imagem sentada, te olhando, te esperando, pensando e repassando por cada lugar que a sua mão passou em meu corpo; sentindo as mesmas sensações na poltrona do ônibus.
A chuva continua grosseira, a vida continua grosseira, você continua grosseiro. E a vontade de ter-te também continua grosseira, e mais que grosseira. Mas o que resta depois da grosseria que cometi de te possuir entre amigos, de tentar um beijo, de rejeitar suas desculpas.
O que resta depois que de por sua cabeça em meu colo, o que resta depois de beijar-lhe a face, o rosto; o que resta depois de dar-te a mão, adormecer ao teu lado.
Eu te pedi um beijo que você negou, eu te pedi a mão e você a tirou, eu pedi um sinal de apoio e você se virou, eu pedi um adeus, você se calou, me culpou.
E o que resta de tudo isso é a sensação de que paira um grande ‘xis’ em tudo o que vivi.
E naquele paraíso eu ainda pensei em você, e naquela poltrona eu ainda te quis ao meu lado, e na descida daquela escada, eu ainda assim queria que você erguesse a mão em sincronia comigo a fim de alcançar o teto.
E ainda assim eu quis dividir com você meus discos, meus livros, meus amigos, minha cama, minhas mãos, meu lugar no bar, minha cerveja, meu maço.
E aquele moço de branco me seduziu, mas você me dominou. Me ganhou, me mudou.
A vida é engraçada, as coisas são engraçadas.
O cara passa anos sem namorada, passa dias me olhando, me cantando sem palavras, me ganhando do disfarce de olhares.
E numa noite nos encontramos no bar, e meu coração dispara, ele me olha de longe, eu olho de longe, ele nem percebe, sou discreta.
Os amigos decidem ir proutro lugar, eu não quero ir, mas vou, ele não vai.
Na saída eu o olho, penso que é impossível que ele não tenha ganhado, que havia me ganhado.
Ele acha que tô com outro cara, eu não estou.
Eu me vou, uma semana depois ele tá namorando com uma vadiazinha loira.
DETALHE: COMEÇOU O NAMORO NAQUELA FESTA QUE EU DEIXEI DE IR. NAQUELA NOITE. NAQUELA N O I T E ! DROGA
Valeu vida, valeu cara.
Você nunca me disse uma palavra sequer, comentou qualquer bobagem dia desses numa de minhas fotos no Orkut, e mais nada.
Planejei uma viagem pensando em você, planejei sábados quentes naquele bar, domingos cinzas vendo filmes , você me abraçando.
Viajei. Sozinha.
Fui discreta, fui traída pela expectativa de te ganhar.
Que ela aproveite seus abraços, e seus carinhos, que você a trate bem , como eu quis que você me tratasse.
Que a vida dê a vocês muitos filmes vistos juntos, muitas músicas só de vocês.
E aliais, muito prazer.
T.
T²