14 de junho de 2012

impropérios sérios


o céu cinza , as nuvens carregadas , aquela garoa fina , típica .
 
reunião de pais e mestres , eles não podiam ter escolhido dia melhor ?
 
eu bebo sim . 
demais . 
eu fumo sim . 
demais .
eu falo sim . 
demais . 
eu sofro sim . 
demais .
 
e é uma bebedeira cheia de culpa , e é uma tragada clichê , e é um falar rápido , aos tropeços , e é um sofreguidão sem fim , sem culpa , cheia de lágrimas e saltos no escuro .
 
sem contar as bebedeiras incontáveis , cheias de pecado e desonras . 
sem contar os cigarros molhados , nunca fumados .
 
minhas histórias são para ser lidas por leitores saltantes de uma página a outra do primeiro capítulo ao ultimo , sem medo , sem culpa . eles me entenderão .
 
a memória me falha , um monólogo sem fim , a história sem coadjuvantes , uma história sem mocinha , sem final feliz , a história cheia de clichês romanticos , com frases de Caio Fernando Abreu e Clarice Lispector estampadas na capa .
 
será , que me tornei assim como tantas outras obcecada pelo hermano junk ?
 
sozinha no quarto , conluo que enfim posso brincar , como sempre quis sozinha , brincar de me trancar num armário qualquer , coma  cabeça dentro da sacola , esperando que ninguém me encontre antes de que todo o ar se esvaia .
 
brincando de sorte/azar com a morte
 
Lendo Sandman como se não houvesse nada além de enredos coloridos e quadrinhos
 
e os dias seguiam entre boas histórias , bebidas e sexo .
 
'minha garota predileta' é assim que ele me chamava . 
'meu junk predileto', eu retribuía .
 
apesar de até  agora nenhuma substância ilegal ter sido utilizada por ele , enquanto estávamos juntos . sabíamos que aconteceria mais cedo ou mais tarde .
 
era assim que eu gostaria que ele imaginasse . 
porque sem dúvida o significado de 'meu junk favorito' pra mim era outro .
 
sabia que mais cedo ou mais tarde , esse relacionamento , essa quase relação , esses olhares recheados de cumplididade , os risos pelos cantos da boca , e os corpos se aproximando como imãs , terminariam . me destruíriam .
 
da pior forma possível .
 
ele me conta hitórias , histórias de suas mulheres que mais me parecem com seres fantásticos , brotados de cabeça de um adolescente da purbedade .
 
mas me dói quando retorno a realidade e me lembro de quem ele de fato é .
 
tudo verdade . felizmente pra ele , infelizmente pra mim .
 
tão diferentes , a realização de um sonho , me tornou-me refem dessa iminente trajédia .
 
ele se vai . ele se vai , ele se vai . 
ele faz bico e reclama atenção .
 
levanto a cabeça lentamente, inclino-me e o beijo . beijo de leve .
 
penso em palavras que ainda não dissemos .
 
conto mais uma história triste , solto mais algumas lágrimas , aperto forte a sua mão .
 
eu sei . posso ver em seus olhos , a vontade de ficar . mas ele também sabe que não vai . sabe que precisa me deixar .
 
tem barreiras que não são transponíveis . nem mesmo pra possibilidade do amor .
 
não gosto de praia . da areia entre meus dedos , do forte calor roubando meus líquidos , produzindo mais líquidos .
 
entre praia e asfalto trocamos salivas , líquidos sagrados , na dança da sedução .
 
 
 

entre as leituras obrigatória para defesa do tão suado mestrado , eu me rendo a sua música , ao som que parte de seu interior , passa por seus dados e boca , me instiga me inspira .
 
eu o amo , passa pela minha cabeça e eu logo retorno a luta marxista filosófica .
eu me entrego a cada acorde , eu me rendo a cada nota , e ele nota , me nota , me olha e aprova .
e eu volto a rimar , rimas vulgares , bobeiras .
 
eu penso em criar sentido , eu penso em sentir a sua criação .
 
ainda não consegui entender ,e lá se foram duas semanas desde que você chegou, se instalou no apartamento ao lado . na zona oeste dessa cidade sem fim , sem luxo , sem móveis , sem aliança , sem orgulho .
 
e eu me pergunto por quanto tempo , e eu me pergunto por que aqui , e eu me pergunto por que eu .
 
enfim você para de tocar , e eu finjo estudar , desviando o olhar . ele percebe , ri entre uma tragada e outra se aproxima , e senta ao meu lado , calado . esperando um olhar de aprovação . uma brecha para falar .
 
discutimos políticas, vimos um  jogo de futubol de vársea , compramos camisetas iguais , tomamos cerveja na calçada .
 
duas semanas . as mais intensas dos ultimos vinte anos .
você ri . se julga velho .
 
eu acho graça do charme , acaricío seu cabelo encaracolado, sua barba espessa  .
 
sexta-feira a noite .
o retorno pra casa é longo , cansativo .
paro naquele bar , aquele que você não conhece , aquele que nos primeiros dias me acolheu.

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